domingo, 5 de junho de 2011

O PAPEL DOS PAIS NO PROCESSO DE APRENDIZADO DE OUTRA LINGUA

Em primeiro lugar, precisamos entender exatamente o que significa "aprender inglês", para podermos entender a distinção entre acquisition e learning, conforme a respeitada teoria sobre aprendizado de línguas estrangeiras de Stephen Krashen.




O conceito de language learning está ligado à abordagem tradicional ao ensino de línguas, assim como é ainda hoje praticada na escola secundária. A atenção volta-se à língua na sua forma escrita e o objetivo é o entendimento pelo aluno da estrutura e das regras do idioma através de esforço intelectual e de sua capacidade dedutivo-lógica. É um processo progressivo e cumulativo, através do qual se oferece ao aluno conhecimento a respeito da estrutura da língua estrangeira, de seu funcionamento, conhecimento esse que espera-se venha a se transformar na habilidade de entender e falar essa língua.

Language acquisition refere-se ao processo de assimilação natural, subconsciente, intuitivo, fruto de situações reais de interação humana. É semelhante ao processo de assimilação da língua materna pelas crianças; processo esse que desenvolve familiaridade com a língua na sua forma oral, produzindo habilidade prática e não necessariamente conhecimento. Exemplo de language acquisition são os programas de intercâmbio cultural, através dos quais adolescentes e jovens adultos residem em países de língua e cultura estrangeira durante um ano, atingindo um grau de fluência próximo ao de língua materna.

Em language learning, o professor ensina um conteúdo predeterminado e o aluno adquire conhecimento; em language acquisition de preferência não há professor, há, isto sim, interação humana intercultural (entre pessoas de diferentes línguas e culturas), na qual um funciona como agente facilitador e através da qual o outro (aluno) constrói sua própria habilidade, na direção de seus interesses.



Krashen finalmente sustenta que language acquisition explica não só o desenvolvimento da língua materna, mas também a assimilação de línguas subseqüentes, sendo mais importante do que language learning para a assimilação da língua estrangeira, não só para crianças, mas também para adultos.



Portanto, o que a lingüística aplicada moderna preconiza (especialmente para crianças) é acquisition. E para que acquisition ocorra, é preciso que a criança ou o jovem esteja situado em um autêntico ambiente de convívio na língua e na cultura estrangeira. Um ambiente desses, entretanto, dificilmente pode ser criado artificialmente. O elemento fundamental desse ambiente são as pessoas que o compõe.



Se os pais, por exemplo, falarem o idioma estrangeiro com um nível de proficiência equivalente ao da língua materna, e tiverem o hábito de usá-lo no dia-a-dia, irão naturalmente transmiti-lo para a criança no convívio familiar. Entretanto, pais que falam o idioma estrangeiro, porém não habitualmente e não com a naturalidade com que falam a língua materna, não devem iludir-se com a possibilidade de ensiná-lo a seus filhos, uma vez que ambientes de language acquisition são dificilmente criados artificialmente. A língua usada é parte importante do relacionamento entre duas pessoas. A intimidade de um ambiente familiar tem uma identidade única, tornando-se difícil criar ambientes múltiplos, caracterizados por diferentes línguas. A língua que a família usa é a língua que a criança assimilará. Para assimilar outras línguas, a criança terá que freqüentar outros ambientes.



Se o ambiente familiar não oferecer language acquisition, pode-se buscá-lo em outros ambientes (escolas de línguas), nos quais o papel do facilitador é fundamental.



Embora salas de aula não sejam o ambiente ideal para assimilação de línguas estrangeiras, é possível criar-se um ambiente de acquisition em sala de aula. Para isso, o professor deve funcionar como facilitador, preenchendo dois requisitos básicos: domínio sobre o idioma (inclusive competência cultural) em nível de língua mãe e habilidade pessoal para saber explorar os aspectos psicológicos e afetivos do aprendizado de línguas da criança. Se o facilitador falar inglês com sotaque e com outros desvios que normalmente caracterizam aquele que não é nativo, a criança os assimilará, e talvez para sempre.



Os ambientes ideais de language acquisition podem ser classificados em ordem de preferência:



a) Um país de origem da língua e da cultura que se procura adquirir. Por exemplo, os Estados Unidos ou a Inglaterra para inglês. Neste ambiente os facilitadores seriam todos: amigos, colegas, professores, e talvez o(s) próprio(s) pai(s).



b) Um ambiente familiar, como o descrito anteriormente.



c) Uma escola de línguas que saiba e que tenha condições de criar ambientes de convívio multiculturais com situações reais e concretas de interação humana, em que acquisition possa ocorrer. Aqui, os materiais a serem usados são irrelevantes e a existência de um plano didático predeterminado é contraproducente. Fundamental é que haja espaço para improvisação e criação e que o(s) facilitador(es) preencham os dois requisitos básicos: plena competência na língua com sua cultura e habilidade de construir vínculos com crianças e adolescentes no plano afetivo. O ideal é que o(s) facilitador(es) sejam nativos estrangeiros por diferentes razões:

1) Transferem ao aluno sua maneira de estruturar o pensamento em linguagem pura, isenta de desvios (tais como sotaque, artificialidade idiomática, ausência de valores culturais, etc.).

2) Como o magnetismo de opostos que se atraem, a presença do elemento estrangeiro no contato intercultural estimula a natural curiosidade pelo desconhecido e o desejo de explorá-lo. O falante nativo é a personificação da língua e da cultura estrangeira, constituindo-se elemento motivador chave.

3) As limitações do estrangeiro com a língua materna do aluno possibilitam a inversão de papéis, fazendo a criança ou o jovem sentir-se as vezes superior e desenvolvendo-lhe a autoestima.

4) Crianças têm grande resistência ao aprendizado formal, artificial e dirigido. Elas só procuram assimilar e fazer uso da língua estrangeira em situações de autêntica necessidade, construindo seu próprio aprendizado a partir de situações reais. Se perceberem que a pessoa que deles se aproxima fala sua língua mãe, dificilmente se submeterão à difícil e frustrante artificialidade de usar outro meio de comunicação.

É altamente desejável também que tais centros de convivência contem com a participação de estrangeiros nativos de idade semelhante à dos alunos.

Portanto, os pais monolíngües devem cuidar para não caírem no erro elementar de acreditar que para se falar uma língua estrangeira tem que se adquirir conhecimento a respeito dela de forma estruturada, e que esse conhecimento seus filhos devem adquirir através de esforço, e que esse esforço deve ser imposto e cobrado.



Os pais que falam inglês (bem) podem ajudar criando rotineiramente momentos de interação em inglês entre si, despertando assim a consciência e o interesse da criança. O papel dos pais também é importante no desenvolvimento da autoestima e da autoconfiança da criança com relação a seu desenvolvimento na língua estrangeira.



Finalmente, os pais devem saber encontrar um ambiente de convívio que proporcione language acquisition para seus filhos. Aqui cabem dois alertas:



Primeiro: É grande a responsabilidade ao se colocar crianças que ainda não atingiram a idade crítica (e mesmo depois), em clubes, cursinhos ou escolinhas que oferecem cursos de inglês atrelados a planos didáticos rígidos (ênfase em learning), geralmente com instrutores de proficiência limitada. Sotaque, pobreza idiomática, limitações de vocabulário e outros desvios que normalmente caracterizam aquele que não é nativo serão transferidos à criança, causando a internalização dos mesmos e podendo se transformar em danos irreversíveis. Seria como colocar a gema bruta nas mãos de um lapidador aprendiz. Esta é uma área de atividade muito vulnerável a um comércio inescrupuloso e amador que facilmente e freqüentemente explora a boa-fé daqueles que buscam o melhor para seus filhos sem poupar esforços.



Segundo: Uma vez que o momento e a forma ideal de se alcançar proficiência em línguas estrangeiras é a idade escolar, e sendo bilingüismo uma qualificação básica do indivíduo na sociedade moderna, compete às escolas primária e secundária proporcionar ambientes de language acquisition - e já! Os pais devem começar a se conscientizar disso e exigi-lo, principalmente daquelas escolas particulares cujos resultados financeiros não justificam nenhuma postergação.



Schütz, Ricardo. "O Papel dos Pais na Erradicação do Monolingüismo." English Made in Brazil . Online. 05 de junho de 2011.

0 comentários:

Postar um comentário